Assassinado, homem doou cemitério e, ironicamente, foi 1º sepultado

Túmulo de Amando de Oliveira foi o primeiro a ser construído no cemitério Santo Antônio. (Foto: Aletheya Alves)

Campo Grande acumula uma série de curiosidades durante sua história e, entre elas, está  o vereador que resolveu doar parte da sua fazenda para a construção do então novo cemitério e nem chegou a ver a inauguração. Assassinado a caminho de casa, o homem foi o primeiro a ser enterrado no Santo Antônio.

“Amando, que já vinha recebendo constantemente ameaças e avisos sobre sua morte, regressava à fazenda no final do frígido dia 10 de junho de 1914, quando ao atravessar o ‘virador’ de entrada da propriedade, recebeu dois tiros fatais”, narrou o historiador Paulo Coelho Machado.

Encontrado pela família, Amando de Oliveira, que aguardava a transferência dos corpos para o novo e definitivo cemitério, foi enterrado antes mesmo dos que já haviam falecido. Mas, antes de ser assassinado, o vereador da antiga Vila Campo Grande acumulou histórias.

Conforme contou Reginaldo Alves de Araújo, o político deixou Lençóis Paulista, sua cidade, ao lado dos pais em 1899. Na época, a família queria tentar uma vida melhor e Amando chegou por aqui aos 20 anos.

Inicialmente, o homem começou a trabalhar como fornecedor de tijolos e telhas enquanto fabricante. Os materiais eram fornecidos para construir as casas que iriam compor o que hoje conhecemos.

Tendo passado o tempo, Amando ajudou a definir o primeiro plano de alinhamento das ruas da cidade, que na época, ganharam nomes diferentes das atuais. Entre elas estão a Marechal Hermes da Fonseca, hoje Afonso Pena, 15 de Agosto, atual Padre João Crippa, e Rua Santo Antônio, a Avenida Calógeras.

O então vereador ao lado da família, em Campo Grande. (Foto: Arca)

O então vereador ao lado da família, em Campo Grande. (Foto: Arca)

Envolvido com a vida em comunidade, o homem adquiriu muitas terras e, tempos depois, se tornou vereador. De acordo com Reginaldo, talvez esse âmbito de sua vida é que retirou a garantia de sua continuidade.

Mas, antes de retornar ao assunto da morte, ainda há de se contar que Amando foi o vereador que acabou sendo preso por defender Campo Grande. De acordo com historiadores, a Vila foi tomada por 300 homens sob mando do caudilho Bento Xavier.

Sem a segurança dos militares da época, Amando é quem organizou a reação e conseguiu fazer com que o pequeno exército fugisse da cidade. Se sentindo desmerecido na história, o tenente comandante Constantino de Sousa, resolveu mandar prender o vereador.

Na história, já contada pelo Lado B, o 1º juiz de Campo Grande, Arlindo de Andrade, emitiu a liberação de Amando. Mas, ao invés da narrativa simplesmente acabar, ele também recebeu ordem de prisão vinda do tenente.

Assim como o marido, Dorothea também foi enterrada no mesmo cemitério. (Foto: Aletheya Alves)

Para encerrar, a população da vila resolveu se movimentar contra o tenente e, por fim, os dois homens foram soltos.

Três anos depois de ser preso, Amando foi assassinado, apenas cinco meses após aprovar a mudança do local do cemitério. Na época, o vereador havia se tornado presidente da Câmara.

Enquanto os primeiros corpos haviam sido enterrados no local em que hoje é a Praça Ary Coelho, o segundo local havia sido o terreno do atual Sesi. O cemitério mais antigo da cidade só se tornou permanente com a criação do Santo Antônio.

De acordo com a narrativa de Reginaldo, Amando já acumulava desentendimentos tanto por suas terras quanto pela vida política. Ainda assim, o motivo do assassinato nunca foi esclarecido.

“As balas transfixar-lhe o tórax e ficaram encravadas num enorme pé de angico, à margem da estrada, que não passava de uma picada comprida e estreita, no meio do cerradão. O cavalo de nome Sereno, um tordilho mestiço, robusto e fogoso, pertencente a Eduardo Olímpio Machado, chegou sozinho à sede da fazenda, denunciando a anormalidade”, escreveu Reginaldo.

No caminho, a esposa de Amando, Dorothea de Oliveira, foi quem encontrou o corpo com duas moedas de prata nos bolsos. Identificados, os assassinos eram pistoleiros goianos que usavam os nomes de Diogo e Delmiro.

“Os motivos, segundo os contemporâneos do fato, tanto podiam derivar de desavenças políticas como de questões de terras, e provavelmente havia mais de um mandante do hediondo e covarde crime que traumatizou a Vila de Campo Grande. Foi assim que o doador do terreno para o cemitério Santo Antônio ocupou a primeira sepultura aberta”, completa Reginaldo.

CREDITO: CAMPO GRANDE NEWS